DORSAL ATLÂNTICA – “Antes do Fim”
Lembro-me que ouvi pela primeira vez uma música da Dorsal Atlântica em idos de 1999, numa coletânea chamada “Planet Metal Volume 7”, que acompanhava a revista de mesmo nome. A música se tratava de “Caçador da Noite”, e estava numa versão ao vivo, retirada do ‘live álbum’ “Terrorism Alive”. Obviamente eu já havia ouvido falar muito na Dorsal Atlântica, assim como já tinha lido bastante a respeito da banda, mas até aquela época eu não tinha qualquer material do grupo. Como havia o endereço postal da Dorsal Atlântica na coletânea, peguei a caneta e o papel (nada de e-mail, a internet ainda não tinha tanta força), fiz uma carta e corri para os Correios. Alguns dias depois recebo a resposta, também “escrita no punho”, pelo próprio Carlos “Vândalo” Lopes. Sinceramente, achei aquilo fantástico! Confesso que até me emocionei ao receber tal missiva (até hoje devidamente guardada), e a partir de então comecei a adquirir todos os materiais da Dorsal Atlântica, alguns diretamente com o próprio Carlos, começando pelo “Antes do Fim”. Não, não foi o vinil, na época já peça rara e, segundo o próprio Carlos, ele tinha apenas um exemplar do LP, de onde fez uma cópia em K-7 pra mim. A arte veio em fotocópia, mas, sinceramente, não liguei e quando o material chegou a minhas mãos tratei logo de colocar no aparelho de som. Treze anos afastava o lançamento original da data que ouvi pela primeira vez tal obra metálica. Não tive qualquer dúvida, aquela banda era a melhor coisa que eu pude ouvir em anos, no meio Heavy Metal. Tal obra e de suma importância para o Heavy Metal nacional, assim como a Dorsal Atlântica o é. “Antes do Fim” foi lançado oficialmente em 1986 pelo selo Lunário Perpétuo, e sua versão original (em vinil) é praticamente uma raridade, porém pode ser encontrada em alguns sites na internet, com preços que variam entre R$. 60,00 e R$. 300,00. O disco traz nove músicas em pouco mais de 37 minutos de duração. São simplesmente nove canções de pura ode ao Hardcore/Metal (não confundir com esse tal de Metalcore atual), com letras fortes, ácidas e de fácil entendimento. Sim, um som extremo, para a sua época (e até mesmo hoje em dia), mas com vocais que se deixavam entender, até mesmo pela preocupação que Carlos Lopes sempre teve em transmitir sua mensagem, vezes clara, vezes embutida e que careciam de uma leitura atenciosa para se entender. “Antes do Fim” simplesmente virou um marco para o cenário Heavy Metal nacional e vendeu bastante, em se tratando de um álbum de uma banda de Heavy Metal que não tinha qualquer apoio de grandes gravadoras. A legião de fãs seguia a Dorsal Atlântica onde quer que a mesma fosse, e não se limitava apenas ao seu Estado. A banda rodou oBrasil, tocando em diversos Estados, e sendo recebida em alguns lugares como banda de grande porte. A banda era simplesmente idolatrada, tudo graças ao poder de “Antes doFim”. Mesmo não contando com uma grande produção (o disco foi gravado em apenas dezoito horas, incluindo a mixagem, numa mesa de oito canais), as músicas ficaram bem definidas, com toda a parte instrumental sendo bem audível, e mostrando que os músicos sabiam tocar, desde o mais violento Hardcore como partes mais técnicas e que beiravam o puro Heavy Metal. Temas como “Caçador da Noite”, “Álcool”, “Vorkuta”, “Joseph Mengele”, “Guerrilha” e “Morte aos Falsos” são verdadeiros petardos, de deixar qualquer um atônito. Imagino como tais músicas eram recebidas na época de seu lançamento. Por trás de todo o poder do álbum ainda tinha a figura, podemos dizer mística, da Dorsal Atlântica, que além de Carlos Lopes, contava com seu irmão Cláudio “Cro-Magnom” Lopes e com o baterista Hardcore. O trio era simplesmente idolatrado e considerado um verdadeiro deus, com alguns agindo de forma agressiva e não aceitando nada mais “leve” que a Dorsal, fato que chegou a preocupar Carlos Lopes: “Creio eu, que os cintos de balas e as pulseiras de pregos corroboravam esse radicalismo, de certo modo”, comentou Carlos no texto incluso na regravação de “Antes do Fim”. Isso, mais letras que muitos consideravam polêmicas, como “Joseph Mengele”, “Caçador da Noite” e “Morte aos Falsos”, tornavam os shows da Dorsal Atlântica verdadeiros barris de pólvora. O disco, oficialmente, vendou cerca de três mil cópias, porém, segundo estimativas da fábrica que prensava o LP esses números passaram dos dez mil, que não foram repassados aos músicos. A capa, uma das mais simples e ao mesmo tempo mais expressivas do Metal nacional, de “Antes do Fim” não era para ser a que conhecemos atualmente, com uma caveira de olhos esbugalhados, cheia de pregos (um desenho feito por Carlos para uma camiseta da banda), e sim uma apresentando alguns cadáveres em mesas, que foi censurada na época. “Antes do Fim” foi relançado (e regravado) em 2005, no formato CD. Carlos Lopes foi responsável pelos vocais, guitarra e baixo. A bateria ficou a cargo de Américo Mortágua. A regravação recebeu o título de “Antes do Fim Depois do Fim”, trazendo alguns melhoramentos na parte instrumental, mas deixando intacto o espírito rebelde da versão original. Mais de duas décadas depois do lançamento fui presenteado com o LP original, por um amigo. Descrever a emoção de ter esse disco em mãos é quase impossível. Neste exato momento estou ouvindo meu vinil, muito bem conservado, sem qualquer arranhão e com aquele cheiro de vinil que ultrapassou a barreira do tempo. Para aqueles que se dizem admiradores do Heavy Metal nacional da década de 80, “Antes do Fim” é item obrigatório e indispensável em sua coleção de discos. “E eram noites de lua cheia nas baixadas fluminenses, além dos estupros e assassinatos cometeu-se ‘Antes do Fim’, este disco”. (Extraído da contracapa do vinil)
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